logo RCN
Imagem principal

Ela dançou. O país tremeu. E mais uma vez, o brasileiro escorregou.

Coluna publicada no dia 17 de junho de 2025

Patrícia Alencar é prefeita reeleita de Marituba, no Pará. Lidera uma das cidades mais desafiadoras da região metropolitana de Belém. Tem um governo com entregas robustas, aprovação popular alta e um mandato reconfirmado com 71% dos votos. Mas nada disso foi suficiente para protegê-la de um linchamento moral, gratuito e coletivo — motivado não por crime, corrupção ou abandono da função. Mas por um vídeo.

Ela dançou. Dançou de biquíni, num perfil de Instagram privado. O vídeo foi vazado, e então o tribunal da internet entrou em cena. Foi como se a política tivesse quebrado o código sagrado da moral performática: o de que uma mulher, especialmente uma mulher no poder, precisa se comportar segundo os padrões do século XIX, mesmo estando no cargo em pleno 2025.

Se fosse um homem, de sunga, numa lancha, com copo de uísque na mão e dancinha desengonçada, o comentário geral seria: “Rei da resenha”. Mas como foi uma mulher, é "vergonha", "baixeza", "desrespeito ao cargo".

A pergunta que resta é: por que tanto escândalo? É que, para muita gente, mulheres só podem ocupar o poder se pedirem licença. E de preferência, discretas, contidas, recatadas. O mandato pode até ser delas — mas o corpo, não. A imagem, muito menos.

Patrícia não dançou contra a Constituição. Não dançou em cima de verba pública. Não dançou com o dinheiro da merenda, nem na farra das licitações.

Ela dançou com a liberdade de ser mulher e política. E isso, para uma parcela hipócrita da sociedade, é insuportável. Mais insuportável do que prefeitos que somem das cidades. Mais insuportável do que vereadores que compram votos e vendem consciências. Mais insuportável do que deputados que não devolvem uma emenda, mas desfilam moral em púlpito.

O caso da prefeita Patrícia revela uma doença crônica do imaginário político brasileiro: a obsessão por controlar mulheres públicas através do julgamento moral.

Essa sociedade que finge se importar tanto com o decoro — ignora a entrega, as obras, os avanços, os números. E faz isso porque, no fundo, espera das mulheres no poder uma penitência silenciosa. Um pedido de desculpas por terem chegado lá.

A performance exigida não é administrativa. É comportamental. E se essa mulher ousar sair do script, rir alto demais, vestir o que quer, dançar... A punição é viral.

E aí fica o convite ao leitor: Você está julgando a prefeita pelo que ela entrega à cidade — ou pela forma como ela vive o próprio corpo?

Se a resposta for a segunda, talvez o problema não seja a dança dela, e sim a rigidez das suas próprias convicções, que continuam no século XIX.

Talvez o que incomode mesmo não seja o biquíni, mas a autonomia. Talvez o que irrite não seja a música, mas o fato de que, mesmo dançando, ela governa melhor do que muitos engravatados sisudos que nunca dançaram, mas sempre pisaram na democracia.

Patrícia Alencar foi julgada por ser mulher, livre e prefeita. Não necessariamente nessa ordem. Mas ainda é prefeita. E entregando.

E, se for preciso, ela dança de novo. E com razão: enquanto ela dança, tem muito marmanjo engravatado que tropeça em escândalo.

Dona Norma celebra 74 anos de uma vida marcada por trabalho, amor e dedicação à família em Otacílio Costa Anterior

Dona Norma celebra 74 anos de uma vida marcada por trabalho, amor e dedicação à família em Otacílio Costa

A COLHEITA Próximo

A COLHEITA

Deixe seu comentário